A NEBLINA DO MEU HERMOM

ORVALHO“Oh, quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união…”
Salmo 133:1,3.
Amanheço com o novo dia.
O inverno estende seu manto de neblina por sobre o vale da Ribeirânia que abriga os milhares de moradias de classe média: nenhuma se destaca de forma especial.
No horizonte as altas e elegantes silhuetas esbranquiçadas dos prédios da Fiúza refletem a luz que vem do leste.
Por instantes, ao terminar a subida da Leão XIII e contornar as curvas da rotatória na Praça Assis Chateaubriand, ainda preocupado com o trânsito intenso, começo a descida rumo ao nosso Jordão, o córrego do Retiro: tal qual Jesus durante a segunda tentação, estou no alto de uma região elevada. De lá posso ver o horizonte e imaginar toda a extensão de terra que forma os mais diversos bairros da zona sul. Um “demônio” diz, a mim, professor que quase nada tenho: “Eu te darei todo poder e riqueza destes reinos, porque tudo isto foi entregue a mim, e posso dá-lo a quem eu quiser. Portanto, se ajoelhares diante mim, tudo isto será teu. “Eu respondo mentalmente: “Você adorará o Senhor seu Deus e somente a Ele servirá.”
Essa é só uma lembrança de Mateus 4: 6,8.
Mas lembrança puxa lembrança, e ao passar pela pequena floresta de ciprestes cobertos de orvalho, ao lado direito de quem desce a Leão XIII, ouço de meus irmãos de Loja : “Oh, quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união… É como o orvalho de Hermon, que desce sobre os montes de Sião, porque ali o Senhor ordena a bênção e a vida para sempre”. Salmo 133: 1,3.
Então aproveito o momento para agradecer pelo dom de minha vida: em especial o dom que me permite ser um educador.
Digo isso porque o Monte Hermon está localizado no extremo norte de Israel, ao norte de Dan e leste de Tiro. É um dos pontos mais altos da região. Também é chamado de ‘monte grisalho’ por ser constantemente coberto de neve, o orvalho que desce sobre suas alturas está em contraste permanente com a aridez das áreas circundantes. Rega toda a terra, alimentando córregos e rios, inclusive o Rio Jordão, principal fonte de água na região. Esse banho de orvalho torna a região fértil e cercada por carvalhos, pinheiros e vinhas abundantes.
E educar é dar banhos de orvalho na aridez da ignorância, é dedicar anos de uma vida, até os cabelos ficarem tão grisalhos quanto o Hermom, é mergulhar a cada dia num Jordão em busca de um milagre: o de um dia ver em nosso país o educador/professor ser respeitado e amado e sua profissão, quase sacerdócio, ser valorizada propiciando a ele e à sua família uma vida digna, sem a necessidade de uma rotina, às vezes, de mais de sessenta aulas semanais.
Em poucos minutos já estou próximo à Maurílio Biagi.
Atravesso meu Jordão (o Retiro Saudoso), deixando Leão XIII e suas doutrinas sociais e econômicas, nas quais ele argumentava sobre as falhas do capitalismo e do comunismo:ficou famoso como o “papa das encíclicas sociais” sendo a mais conhecida de todas nessas matérias, a Rerum Novarum, de 1891.
Chego aos portões do Colégio Anchieta — meu Monte Sião — para mais um dia sagrado, e de muito trabalho.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
www.tortoro.com.br

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