AC TÓRTORO E A BIBLIOTECA DA ARL – ACADEMIA RIBEIRÃOPRETANA DE LETRAS NO CENTRO CULTURAL PALACE – 2012

“Os espíritos imortais dos mortos falam nas bibliotecas.”

Plínio, o moço

Quando assumi a presidência da ARL em 18 de março de 1994, sucedendo ao Dr Luiz Carlos Raya, tomei conhecimento de que a academia tinha um bibliotecário , Dr João Caetano de Menezes.
Mas cadê a biblioteca ?
Aos poucos, descobri alguns livros da tal “biblioteca” numa prateleira na biblioteca do SESC , rua Tibiriçá, 500.
Descobri, também, que o restante da “biblioteca”, aliás, a maioria do acervo,  se encontrava em poder do acadêmico Mário Moreira Chaves, e fui até a residência dele. Já em avançada idade, e sem um espaço adequado para guardar  livros, revistas, jornais, ele os havia colocado nos fundos da residência, onde estavam sendo, aos poucos, deteriorados pela ação das intempéries.
Pagamos, então, ao proprietário de uma caminhoneta para recolher, no mesmo dia, o acervo do SESC e da residência de Moreira Chaves, pouco antes do falecimento desse inesquecível acadêmico, de rara cultura, presidente do sodalício ( 1952 – 1953) na época  de sua fundação em 1947.
Adquirimos prateleiras e um armário de aço novos que, foram colocados na biblioteca do Colégio Anchieta, rua Chile , 845, por uma deferência especial do Prof. João Alberto de Andrade Velloso, mantenedor do estabelecimento de ensino. Colocamos neles tudo que poderia ser aproveitado.
A acadêmica Nilva Mariani   e eu, durante todo um dia  de trabalho, separamos tudo o que ainda tinha condições de ser aproveitado e jogamos no lixo, ao final do processo,três tonéis de duzentos litros cada um repletos de papéis cheirando a mofo, urina de rato, barata morta.
Segue cópia de um relatório feito na época, 12/4/1996, para registro histórico:
“ Depois de visitar meu amigo e irmão Sérgio Nalini, na Receita Federal, para colocar em dia os documentos da ARL , fui ao Colégio Anchieta onde trabalho até hoje. Lá a Nilva já me esperava, conforme combinado no dia anterior, para arrumarmos um pouco do material vindo da casa do Dr  Mário Moreira Chaves. Em decisão conjunta, consciente e necessária, jogamos no lixo todos os originais de contos ( caixas deles ) de concursos realizados pela ARL – todos só com pseudônimo. Pensamos : quem poderia se interessar por escritos de pessoas desconhecidas, alguns de péssimo nível literário, sujos, corrigidos/rasurados, com cheiro de urina de rato ? Também jogamos no lixo jornais antigos, mal conservados, imundos,fétidos, empoeirados, em decomposição devido ao longo tempo semiexpostos às intempéries, em um quartinho de fundo e em  prateleiras enferrujadas. O Ricardo, da Confiança Mudanças, cobrou duzentos reais, pois teve que dar cinco viagens para transportar tanto papel, na maioria sujo e sem nenhum uso: centenas de envelopes timbrados , sem uso, e papéis de carta, também timbrados e sem uso. Deu-me  pena, mas não valeria a pena guardar nada daquilo. Mas, no meio de tanto lixo e pó, há muitos documentos interessantes.  Notícias no jornal sobre a posse do Dr Raya, recortes de interesse da ARL, misturados com recortes que nada têm a ver com ela. Pedaços de papel picado, uma placa de prata no meio dos restos de cartões de Natal, folhetos de propaganda, e pó, mais pó, muito pó… O que restou é trabalho para mais de dois meses, a ser feito minuciosamente, guardando cada documento, cada recorte , em local adequado, seguro, de tal forma que  possam ser localizados, quando necessário, no futuro. Um trabalho árduo mas, espero, compensador”.
Enfim, desse contato com Mário Moreira Chaves — acadêmico que avaliou meus poemas ( juntamente com Ely Vieitez Lisboa e Nilva Mariani)  no final de 1993,  para aprovar minha entrada na ARL ,— nasceu entre nós uma relação de confiança recíproca a ponto de ele, em uma de minhas idas à sua residência, entregar-me o 1º livro de atas da ARL , e todos da academia diziam que ele não o entregaria a ninguém enquanto vivo, dado o amor e respeito que dedicava à história que  ajudou a transformar-se em realidade.
No dia de sua morte, fui logo cedo ao velório para receber seu corpo e tomei conhecimento de que ele desejava ser sepultado com a Bandeira do Estado de São Paulo.  Voltei à minha casa, apanhei a Bandeira paulista que eu guardava há muito tempo,  sem imaginar que ela cobriria a urna funerária de um homem que escreveu, com seu trabalho e amor pela cultura, páginas inesquecíveis da história ribeirãopretana no final do século XX e que, à sua maneira, de acordo com as suas possibilidades, preservou um patrimônio que hoje, aqui no Palace, graças ao trabalho de minha cara amiga Vera Regina Gaetani, encontra um espaço digno para ser visto, pesquisado e admirado por todos aqueles que amam e preservam a nossa história, a história da Academia Ribeirãopretana de Letras, que se confunde com a própria história de Ribeirão Preto.70_11634-1 70_11626-1 70_11627-1

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