UM TELEFONEMA DO CÉU: HOMENAGEM PÓSTUMA PARA NEYDE DUARTE PEIXOTO

“Eu sou as estrelas que brilham suaves na noite / Não fique no meu túmulo a chorar / Eu não estou lá / Eu não morri.”
Katherine Jenkins

Manhã fria e chuvosa de 22 de agosto de 2017, um vendaval que me fazia lembrar Fernando Pessoa — “Meu coração triste, meu coração ermo,/ Tornado a substância dispersa e negada / Do vento sem forma, da noite sem termo, / Do abismo e do nada!” —espantava os pombos que, agourentos, teimavam em arrulhar pousados na antena de TV.
Era o dia em quem o mundo ia começar a acabar, segundo a organização religiosa Unsealed: ontem, nos EUA, foi possível ver o sol atravessando o planeta de costa a costa e, segundo eles, os escritos bíblicos fazem referências claras a esse fenômeno como o início do fim. O fenômeno está relacionado a um fragmento da Bíblia em que se fala de uma mulher vestida de Sol, grávida e que está sobre a Lua. Há outro ponto que os teóricos levam em consideração: nesse ano, será cumprida uma geração bíblica – 70 anos – desde a criação do estado de Israel, em 1947. Além disso, no século XIII, o rabino Judá Ben Samuel previu que o fim do mundo seria em 2017. Os evangélicos da organização afirmaram que o fim do mundo começará no próximo ano e que terminará em 2024.
Era o último dia do meu inferno astral — os cinqüenta e dois dias do ano, que antecedem nosso aniversário, segundo os Rosacruzes.
Eu refletia sobre esses diversos tipos de fins, quando tocou o telefone.
— Bom dia !!!! Tudo bem? — e a voz rouca e calma, há anos minha conhecida, completou —Liguei para cumprimentar meu amigo…
— Oi Neyde, tudo bem?
Nesse dia — mais uma vez o infalível e esperado telefonema no dia do meu aniversário — a conversa se estendeu por mais tempo do que de costume.
Conversamos sobre as tardes de sextas-feiras em que nos reuníamos — ela, Irmã Regina, Guto e eu — após o expediente, ao final do último dia da semana, para falarmos sobre alunos, pais e acontecimentos da semana no Colégio Santa Úrsula, tomando um refresco, comendo bolachinhas, jogando conversa fora.
Conversamos sobre a semana que passamos em Belo Horizonte fazendo um curso de reciclagem no Colégio Pitágoras.
Relembramos as diversas vezes que estivemos em um prédio das Irmãs Ursulinas na região de Cotia – São Paulo.
Ela, como sempre, mencionou a presença inseparável, ao lado dela, do Cristo de acrílico transparente que dei a ela em um de seus aniversários.
Respondi, ao ser questionado, sobre a vida escolar de sua neta, Isabella, aluna da 3ª. série do Ensino Médio do Colégio Anchieta.
Perguntei sobre seu estado de saúde, instável nos últimos anos, desde o dia em que fiz a ela uma visita rápida no Hospital da Ribeirânia.
Então, despedímo-nos para sempre, após esse telefonema do céu — O primeiro telefonema do céu, título do livro de Mitch Albom — que nunca aconteceu… porque Neyde Duarte Peixoto, nascida em 03/09/1935, naquele momento já havia virado estrela, e brilhava na noite desde o dia 21 de agosto de 2017: ela não morreu.

ANTONIO CARLOS TÓRTORO
ancartor@yahoo.com
www.tortoro.com.br

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